Certamente não foi amor à primeira vista. Na verdade, há até pouco tempo eles não gostavam muito um do outro.
“Eu não o odeio”, Elon Musk tuitou em julho de 2022, “mas é hora de Trump pendurar o chapéu e navegar em direção ao pôr do sol”.
O comentário do fundador da Tesla e da Space X foi motivado por um insulto de Donald Trump – em linhas gerais, chamando Musk de mentiroso. Trump acusou Musk de mentir para ele sobre em quem votou na eleição presidencial.
“Elon não vai comprar o Twitter”, Trump alardeou para uma multidão em um comício no Alasca.
Musk, como sabemos, comprou o Twitter vários meses depois – e ele passou a endossar o arquirrival republicano de Trump, Ron DeSantis.
O governador da Flórida até lançou sua campanha presidencial com um bate-papo no Twitter Spaces.
Mas nos últimos meses, o relacionamento entre Musk e Trump não apenas descongelou – ele atingiu um ponto de ebulição.
Nesta segunda-feira (12/8), os dois devem se sentar para o que muitos esperam ser um bate-papo agradável.
O horário, o formato e a duração específicos são desconhecidos até agora, mas parece altamente provável que a entrevista seja transmitida no X — novo nome do Twitter dado por Musk.
Ambos esperam que a conversa alcance um público além dos usuários pagos hiperativos que dominam a discussão sobre o X atualmente – e que seja livre das falhas técnicas que ofuscaram a campanha malfadada de DeSantis.
O relacionamento entre o magnata da tecnologia e o provável candidato republicano já está em construção há algum tempo.
Do azul para o vermelho
Elon Musk, que se tornou cidadão americano em 2002, disse que votou quase exclusivamente nos democratas por décadas.
Mas ele se irritou com o atual presidente, Joe Biden, por questões como sindicatos — Musk se opõe a esforços para organizar seus trabalhadores das montadoras de automóveis — e por uma rejeição. Ele não foi convidado para a cúpula de veículos elétricos da Casa Branca de 2021, apesar do status da Tesla como uma das maiores fabricantes de veículos elétricos do mundo.
Sob o governo Biden, as empresas de Musk também enfrentaram uma série de investigações federais sobre práticas trabalhistas, sua aquisição do Twitter e acusações sobre falta de segurança do recurso de piloto automático da Tesla.
Em novembro de 2023, ele disse a um entrevistador do New York Times que não votaria em Biden novamente, mas não chegou a apoiar Trump. “Esta é definitivamente uma escolha difícil”, afirmou.
Musk suspendeu a proibição da conta do Twitter do ex-presidente após comprar a empresa.
E talvez o mais importante, ele se aprofundou cada vez mais em preocupações que se alinham perfeitamente com a campanha de Trump: censura e perseguição governamental, reclamações sobre a mídia, oposição à imigração e raiva em relação às ideias “woke”, um termo político de origem afro-americana para se referir a uma percepção e consciência das questões relativas à justiça social e racial.
“Ele anseia por atenção e é um camaleão político”, disse Ryan Broderick, que escreve o boletim informativo de cultura da internet Garbage Day.
Broderick disse que as postagens de Musk mudaram drasticamente alguns anos atrás.
“Ele estava tuitando coisas neoliberais, despreocupadas, bandeiras do orgulho [LGBTQ] e assim por diante, até por volta de 2018, e a mudança aconteceu bem drasticamente depois disso”, disse ele.
Desde que assumiu o Twitter, Musk foi se envolvendo cada vez mais em controvérsias políticas e espalhou notícias inflamatórias – e às vezes completamente falsas.
Durante os recentes tumultos no Reino Unido, ele se envolveu em uma troca de farpas com o primeiro-ministro Keir Starmer, alegando que “a guerra civil é inevitável” e compartilhando uma postagem falsa sobre “campos de detenção” nas Ilhas Malvinas.
Ele também acreditou nas alegações de Trump – sem provas – de que a fraude eleitoral é endêmica nos EUA.
Pesquisa do Center for Countering Digital Hate – uma organização que Musk tentou processar em um caso que foi arquivado no início deste ano – observou que, neste ano, até o momento, Musk tuitou alegações falsas ou enganosas sobre a eleição 50 vezes.
E ele interage regularmente com figuras da direita radical e contas pró-Trump em sua própria plataforma, amplificando seu alcance.
Os nerds fãs de Trump
Ao mesmo tempo, suas conexões no Vale do Silício o colocam no círculo interno de Trump. Musk era membro da chamada máfia do PayPal – acionistas que fizeram fortunas quando a processadora de pagamentos foi comprada por US$ 1,5 bilhão e que mais tarde se tornaram investidores prolíficos e fundadores corporativos.
O fundador do PayPal, Peter Thiel, é um republicano influente que mais tarde empregou JD Vance em sua empresa de capital de risco, Mithril Capital Management, e depois financiou sua campanha para o Senado de Ohio com uma doação de US$ 10 milhões.
Em março, Musk encontrou Trump em seu resort na Flórida. Alguns meses depois, Musk ofereceu um jantar “anti-Biden”, onde os convidados incluíam Thiel e Rupert Murdoch, de acordo com a imprensa dos EUA.
Musk doou dinheiro para políticos democratas e republicanos no passado. Mas, embora insista que não está doando diretamente para nenhuma campanha presidencial, ele recentemente foi cofundador de um comitê de ação política pró-Trump, o America PAC.
Comitês de ação política têm margem de manobra para gastar grandes quantias apoiando candidatos e causas – embora Musk tenha dito que os relatos de que ele contribuirá com US$ 45 milhões por mês para o PAC são exagerados.
No entanto, seu apoio a Trump foi totalmente garantido poucos minutos após a tentativa de assassinato do ex-presidente no mês passado, quando ele tuitou: “Eu apoio totalmente o presidente Trump e espero sua rápida recuperação”.
Trump parece ter construído pontes com Musk. Em uma entrevista coletiva na quinta-feira, ele disse: “Eu respeito muito Elon. Ele me respeita”.
“Elon mais do que quase qualquer pessoa que eu conheço… ele ama este país, ele ama o conceito deste país, mas como eu, ele diz que este país está em grandes apuros, está em tremendo perigo”, disse Trump.
Musk se tornou um herói para um grupo online de jovens apoiadores, principalmente homens, que podem se alinhar às ideias de Trump, mas que são, de acordo com relatos, eleitores menos confiáveis.
A campanha de Trump parece estar fazendo uma jogada para esse segmento da população.
Por exemplo, o ex-presidente recentemente deu uma entrevista com o podcaster “ousado” Adin Ross, que foi repetidamente banido do site de streaming Twitch por violar as políticas de conduta do site.
“Donald Trump está procurando uma maneira de revigorar sua campanha”, disse Broderick. “Ele é um showman e entende que Elon Musk tem instintos semelhantes.”
Mas ele questiona se a dupla se daria bem frente a frente. “Provavelmente não fará muito sentido”, disse ele. “E talvez alguém diga algo maluco.”