O nome é estranho, engraçado, esquisito. Mas, alto lá! É preciso que se respeitem os rola-bosta, besouros considerados como verdadeiros guardiões dos ecossistemas devido ao trabalho de recicladores naturais. Por serem coprófagos, ou seja, alimentam-se de fezes de outros animais, esses insetos contribuem para a biodiversidade e saúde ambiental.
Os rola-bosta são encontrados em diferentes ambientes, dependendo da espécie. Existem os que só vivem no interior das florestas e outros que podem viver em pastos para a pecuária.
Na Ilha de Santa Catarina, originalmente coberta de Mata Atlântica, se encontram dentro da floresta, mas quem mora perto de áreas naturais pode ter visto algum no seu quintal arrastando uma bolinha de fezes de cachorro. Ainda que reconhecidos como pequenos heróis da vida selvagem, com função importante no ciclo da matéria orgânica, os rola-bosta correm perigo.
— A principal ameaça são os agrotóxicos, que prejudicam a maioria dos insetos benéficos para o meio ambiente, assim como os antiparasitários, que atuam como veneno para os besouros, a exemplo da Ivermectina, que contamina o esterco e o deixa tóxico para esses organismos — explica a professora, pesquisadora e coordenadora do Laboratório de Ecologia Terrestre Animal (Lecota) do Centro de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), doutora Malva Isabel Medina Hernández.
Rola-bosta é importante para os ecossistemas
Por esse motivo, continua a professora, muitas vezes não encontramos os besouros no esterco do gado realizando a função de remoção e limpeza, já que está contaminado por antiparasitários que prejudicam a vida desse inseto e não permite o desenvolvimento de sua cria, as larvas desses organismos.
Aquecimento global pode extinguir espécies na Serra catarinense
Outras atitudes humanas também prejudicam a existência dessas espécies, como o desmatamento de áreas naturais. A degradação dos habitats e a caça de mamíferos nativos diminui os recursos alimentares de muitas espécies.
Da mesma forma, as mudanças climáticas interferem principalmente na distribuição das populações, podendo aumentar ou diminuir a área ocupada dependendo da espécie.
— Algumas podem ser extintas por causa do aquecimento global, principalmente as espécies que vivem nas regiões frias da Serra catarinense — observa Malva Isabel Medina Hernández.
Para a pesquisadora, o mais importante para a conservação das espécies é o cuidado ambiental. Por isso, diz, é importante que as pessoas recebam informações acerca da importância desses insetos na natureza.
— Além disso, o manejo sustentável, com a diminuição do uso de agrotóxicos e antiparasitários é o caminho para manter as espécies em um habitat saudável.
Estudos buscam técnicas de reforço populacional
Atentos aos impactos negativos sobre as populações dos besouros rola-bosta no Estado, um grupo de pesquisadores desenvolve um projeto junto à Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina (Fapesc). A equipe de pesquisadoras pertence ao Laboratório de Ecologia Terrestre Animal (Lecota) dentro do Departamento de Ecologia e Zoologia da UFSC.
O objetivo inicial é a reprodução em laboratório de espécies importantes nas áreas pecuárias. Dessa forma, pretende criar um protocolo de reprodução de espécies nativas que sejam benéficas para as funções ecossistêmicas de remoção do esterco e melhoramento do solo em áreas de pecuária.
— Posteriormente, com as técnicas aprimoradas de reprodução das espécies, o projeto pretende contribuir com técnicas de reforço populacional em áreas carentes desses besouros — diz Malva Isabel Medina Hernández.
No final de outubro, Malva Isabel esteve participando da XIV Reunião Latino-americana de Scarabaeoidologia, realizada na Universidad Nacional de Loja, no Equador. Também participou do evento a doutora Maristela Carpintero Hensen, também pesquisadora no projeto financiado pela Fapesc que inclui uma bolsa de pós-doutorado.
No encontro elas apresentaram quatro trabalhos científicos sobre os besouros escarabeíneos ou rola-bosta de Santa Catarina. Durante a reunião, Malva Isabel participou de duas mesas redondas: “Mulheres na Scarabaeidologia” e “Pecuária e Conservação”, temas relacionados aos estudos dos besouros.
Seria o rola-bosta um deus egípcio?
Se por um lado os rola-bosta sofrem com ações negativas dos humanos, por outro eles têm lugar no panteão egípcio. Os pequenos besouros são relacionados ao deus Khepri, responsável pelo movimento do sol.
Para os egípcios, o sol nascia e morria todos os dias. Por isso, acreditavam que Khepri se transformava em um rola-bosta, a fim de “rolar” o sol de um lado para o outro.
Outra curiosidade acerca desses bichinhos: são capazes de se guiar pela luz da Via Láctea. Tanto que seguem em direção reta mesmo no escuro, concluiu depois de vários experimentos o biólogo Eric Warrant, da Universidade de Lund, na Suécia.
Força para empurrar uma bolinha de esterco mil vezes maior
Tem outra coisa que chama a atenção: dizem que uma bola de fezes pode ser 1.141 vezes maior que o seu empurrador, o rola-bosta. Quando não estão nessa função de rolar esterco, eles usam a força para afastar outros machos.
Conforme estudos, por não terem ossos, os besouros rola-bosta raramente aparecem no registro fóssil. Mas sabe-se que esses escaravelhos existiam cerca de 30 milhões de anos atrás, porque os paleontólogos encontraram bolas de esterco fossilizadas do tamanho de bolas de tênis daquela época. Já houve registro de rola-bosta em todos os continentes, exceto na Antártida.
Para quem já viu dois rola-bosta juntos: geralmente é um macho e uma fêmea preparando uma bola para colocar os ovos no ninho.
Mas se viu um rola-bosta subindo em cima de uma bola de esterco, fique sabendo que é parecido com a gente correndo da areia quente na praia: sobem em cima para esfriar os pés. Pode ser também que estejam procurando um ponto mais alto para se orientarem a fim de achar o caminho de casa.
NSC