Os relatos de mau comportamento dos turistas parecem estar aumentando em todo o mundo – seja derrubando formações rochosas antigas em Nevada, nos Estados Unidos, ou simulando atos sexuais com uma estátua em Florença, na Itália.
Nos últimos meses, houve protestos contra o turismo em massa e o mau comportamento dos visitantes em diversos pontos do planeta. São duas questões que, aparentemente, passaram a causar mais desagrado entre as pessoas.
Websites e contas no Instagram, como Tourons of Yellowstone e Welcome to Florence, colecionam imagens de turistas com comportamento questionável. E, a cada novo registro, muitas pessoas se perguntam: “O que eles estavam pensando?”
Para o psicoterapeuta clínico e ávido viajante Javier Labourt, esta questão tem diversas respostas.
“Existem muitos fatores que podem influenciar este [tipo de] comportamento”, segundo ele. “Pode haver fatores individuais, pode haver fatores de contexto, e pode haver fatores de grupo, se a pessoa estiver viajando em grupo.”
“Por isso, acho que a primeira pergunta que precisamos fazer para nós mesmo é ‘OK, esta pessoa teria este tipo de comportamento em casa?'”
O mau comportamento dos turistas pode ser causado por uma atitude impensada, como bloquear uma calçada para conseguir a imagem perfeita para o Instagram. E pode também incluir comportamentos ofensivos – como posar nu em público – e até perigosos, como se aproximar de animais selvagens.
Alguns tipos de comportamento inadequado dos turistas – como tentar ajudar um animal a se reunir ao seu rebanho no Parque Nacional de Yellowstone, nos Estados Unidos – podem se dever ao desconhecimento das normas sociais em geral e do que é aceitável em cada lugar, segundo a professora de gestão do turismo e hotelaria Alana Dillette, da Universidade Estadual de San Diego, nos Estados Unidos.
“Acho que grande parte é falta de conhecimento e compreensão dos seus impactos sobre o lugar que você está visitando”, explica a professora.
“Acho que muitas pessoas viajam pensando em como será a experiência para elas, mas não pensam no impacto que [suas ações] causam sobre o local onde elas estão, pois elas simplesmente não detêm esse conhecimento.”
Outra forma clássica de mau comportamento dos turistas é o que a estudiosa do comportamento e autora do livro On Being Unreasonable (“Sobre ser irracional”, em tradução livre) – a professora Kirsty Sedgman, da Universidade de Bristol, no Reino Unido – chama de “energia do personagem principal”.
Quando estão longe de casa, algumas pessoas podem passar a ser grosseiras e exigentes, como se os moradores locais, os profissionais de serviços e outros estivessem ali apenas para servi-los.
Este comportamento sofreu um aumento considerável nos aviões. Os relatos de air rage (“fúria aérea”, em inglês) passaram agora a ser comuns, com passageiros beligerantes, que ignoram as normas básicas de cortesia e se recusam a atender às instruções da tripulação.
A situação chegou a tal ponto que, em 2021, coalizões de linhas aéreas enviaram uma carta para o Departamento de Justiça dos Estados Unidos, pedindo ajuda para combater o problema.
“Não é apenas o comportamento das pessoas que está piorando”, explica Sedgman. “É muito frequente que, quando elas são questionadas sobre esse mau comportamento… agora, as pessoas [ficam com raiva] com muito mais frequência. Esta sensação de ‘não me diga o que fazer’ é muito forte.”
Mas Labourt acredita que existam questões psicológicas mais profundas em jogo.
“[Quando viajamos] precisamos nos conectar ao destino, a uma nova cultura”, afirma ele. “Esta conexão exige que nos coloquemos em uma posição emocional diferente e nem todas as pessoas estão prontas para isso.”
Impacto psicológico e financeiro
Muito já se escreveu sobre o impacto ambiental do turismo em massa. Mas o impacto do mau comportamento dos turistas – particularmente do vandalismo – é algo frequentemente esquecido nas histórias sobre os maus viajantes, muitas vezes contadas por meros espectadores.
É muito difícil calcular os efeitos financeiros e psicológicos desses episódios causados por turistas, como a destruição de arte rupestre sagrada ocorrida no sul da Austrália, em 2022.
“Quando locais históricos associados a um grupo marginalizado são profanados e vandalizados, é como se os seus corpos, suas vidas e sua história não tivessem importância”, explica Brent Leggs, diretor-executivo do Fundo de Ação para o Patrimônio Cultural Afro-Americano. “Aquilo frequentemente desperta recordações de injustiças históricas e racismo sistêmico, reacendendo o trauma geracional.”
Mesmo os danos que não pretendem causar prejuízos intencionais ainda podem trazer altos custos emocionais e financeiros.
“Muitas vezes, os proprietários de imóveis e os administradores de bens históricos já enfrentam dificuldades para cuidar desses recursos”, destaca Leggs. “Por isso, quando uma construção é vandalizada, surge mais uma responsabilidade financeira indevida.”
E o pior é que, às vezes, os danos causados não podem ser desfeitos.
Em 2021, por exemplo, visitantes rabiscaram seus nomes sobre petróglifos de mais de 4 mil anos de idade no Parque Nacional Big Bend, no Texas (Estados Unidos). Eles destruíram permanentemente um local sagrado para as comunidades indígenas locais.
Obras de arte e cultura de valor incalculável já foram danificadas pelo mau comportamento dos visitantes.
O que pode ser feito?
Dillette acredita que a forma de publicidade do turismo, muitas vezes, agrava o problema.
“Acho que existe esse elemento de anonimato que as pessoas sentem quando viajam e faz com que elas ajam de formas em que não se comportariam em outras ocasiões”, explica ela. “Mas acho que parte disso tem a ver com a forma em que… as empresas e os governos vendem o turismo para as pessoas.”
“É por isso que não sou grande fã do turismo de massa… O único objetivo é simplesmente reunir as pessoas em um lugar onde elas possam beber demais, comer demais, consumir demais. É como prepará-las para o fracasso.”
Dillette acredita que participar de experiências de viagem mais localizadas pode ajudar os visitantes a serem mais conscientes, tanto sobre a sua forma de agir em um local distante, quanto sobre o seu impacto às pessoas que moram ali.
Governos de todo o mundo estão tentando reprimir o mau comportamento, criando leis mais rígidas, elaborando normas oficiais de comportamento e estabelecendo multas pesadas.
Exemplos de soluções recentes para lidar com esta situação são a campanha Stay Away (Fique longe, em tradução livre), dirigida a turistas britânicos embriagados em Amsterdã, na Holanda, e a série de novas multas e restrições criadas pela Itália para limitar o turismo e coibir o mau comportamento.
Mas Labourt acredita que os viajantes precisam mudar.
Para ele, viajar pode ter ficado mais fácil para as pessoas, mas nem todos estão preparados emocionalmente para o impacto de sair da sua zona de conforto, o que pode explicar o aumento do comportamento antissocial.
Dillette e Labourt concordam que a solução para este tipo de comportamento se resume, em última análise, em uma mudança de mentalidade, que incentive as pessoas a perceberem que viajar, na verdade, é um privilégio.
Visitar um local significa que você é um convidado na casa de outra pessoa. Por isso, é preciso interagir com pessoas de diferentes origens, de forma ponderada e respeitosa.
“O turismo é muito interessante porque ele tem o poder de literalmente mudar a vida das pessoas”, afirma Dillette. “Ele tem o poder de tirar as pessoas da pobreza, ele tem o poder de conectar pessoas de diversas culturas, religiões e idiomas, que não teríamos se não pudéssemos viajar.”
“Mas é questão de como fazer. Eu não quero dizer ‘não vá a lugar nenhum’, mas vamos viajar com uma visão mais consciente.”
Leia a versão original desta reportagem (em inglês) no site BBC Travel.
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