Uma decisão do desembargador convocado ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) Jesuíno Rissato concedeu a ordem em Habeas Corpus para determinar a soltura de uma mulher transexual que cumpre pena no regime semiaberto em condições incompatíveis com sua realidade.
Ela estava presa em Florianópolis quando obteve permissão para cumprir a pena no regime domiciliar harmonizado, em recolhimento integral e com monitoramento eletrônico. Isso ocorreu porque o presídio da capital não é aparelhado para garantir a segurança da pessoa trans.
A presa então foi para Criciúma, onde há presídio apto a receber reclusos em regime semiaberto. Uma juíza da Vara de Execução Penal deu duas opções à apenada: se recolher em Criciúma nas alas gerais ou retornar a Florianópolis para manter a prisão domiciliar.
A juíza ressaltou que “as pessoas LGBT nas prisões masculinas que não possuem celas/alas estão submetidas a um regime de constante risco, portanto, vulneráveis à violência física, sexual e psicológica sobretudo advinda dos outros custodiados”,
E que não restava outra alternativa que não a concessão da modalidade harmonizada para cumprimento do regime semiaberto para os reclusos da ala LGBTQIA+, a fim de preservar a integridade física e psíquica dos alienados.
A Defensoria Pública de Santa Catarina, que fez a defesa da presa pediu a reconsideração da decisão, de maneira a permitir que ela fique em Criciúma no regime domiciliar ou, alternativa, seja recolhida na penitenciária feminina local.
A juíza negou o pedido por considerar inviável manter uma apenada biologicamente masculina em uma unidade feminina, onde a privacidade das internas é bastante reduzida. Isso criaria constrangimento nas revistas para o banho de sol, realizadas em fila e em grupo, por policiais penais femininas.
O desembargador convocado Jesuíno Rissato destacou que o caso não trata da estrutura prisional para o cumprimento da pena em regime semiaberto, mas sim das condições adequadas para resguardar a vida e a integridade física das pessoas trans custodiadas pelo Estado.
Ele citou decisão do Supremo Tribunal Federal que permitiu a essa população escolher onde cumprir pena e a consequente Resolução 366/2021 do Conselho Nacional de Justiça, que estabeleceu diretrizes que incluem a oitiva do apenado trans para saber de sua preferência.
Assim, a escolha do local de cumprimento da pena pela pessoa trans não é um exercício de livre discricionariedade do julgador, mas uma análise que busca resguardar a liberdade sexual e a integridade física dessa população vulnerabilizada.
Entendimento do desembargador do STJ
“Como se vê, a determinação do local do cumprimento da pena da pessoa trans não é um exercício de livre discricionariedade do julgador, mas sim uma análise substancial das circunstâncias que tem por objeto resguardar a liberdade sexual das pessoas”, escreveu o desembargador.
“A integridade física e a vida das mulheres transgênero presas, haja vista que a resolução determina que a referida decisão “será proferida após questionamento da preferência da pessoa presa”, reforçou.
O desembargador entendeu também que o órgão estatal judicial responsável pelo acompanhamento da execução da pena não deve ter por objeto resguardar supostos constrangimentos das agentes carcerárias e o objetivo do Judiciário é resguardar a vida e a integridade físicas das pessoas presas, respeitando a diversidade de gênero e a liberdade sexual.
“Portanto, é dever do Judiciário indagar à pessoa autodeclarada parte da população transexual acerca da preferência pela custódia em unidade feminina, masculina ou específica, se houver, e, na unidade escolhida, preferência pela detenção no convívio geral ou em alas ou celas específicas”.
Fonte: NDmais.